terça-feira, 26 de janeiro de 2010

As Alterações Introduzidas pela Lei n.º 11.719 de 20 de junho de 2008 no Processo Penal

Considerações Iniciais
O presente trabalho tem como proposta estudar as inovações introduzidas pela lei n.º 11.719 de 20 de junho de 2008 no Código de Processo Penal, no que diz respeito à atuação do juiz de ofício, quando da prolatação de sentença condenatória, e, principalmente, quando nesta, há a nova definição do fato típico, ou seja, do crime, mesmo que o novo enquadramento seja em crime mais grave, ou sejam reconhecidas circunstâncias agravantes ao crime.
O Código de Processo Penal, antes da alteração promovida pela lei n.º 11.719 de 20 de junho de 2008, dava liberdade ao juiz, de definir juridicamente o fato de forma diversa da que constasse na queixa ou denúncia, ainda que essa nova definição do fato tivesse sanção mais grave, devendo apenas, baixar o processo para que, a defesa manisfeste-se em 8 (oito) dias, e caso queira, produza provas, podendo ser ouvidas até 3 (três) testemunhas. Em se tratando de ação penal pública o Ministério Público aditasse a denúncia, e posteriormente abrindo-se prazo de 3 (três) dias à defesa para que esta oferecesse provas, podendo arrolar até 3 testemunhas.
A lei n.º 11.719 de 20 de junho de 2008 altera os dispositivos legais relativos à suspensão do processo, emendatio libelli, mutatio libelli e aos procedimentos constantes do Código de Processo Penal, modificou a faculdade que o juiz tinha de aplicar e/ou reconhecer de ofício as circunstâncias agravantes do crime objeto do processo penal em curso, limitando sua atuação apenas a aplicação da lei em si, sem modificação da descrição do fato típico em sim; e, observando também, a partir dessa nova definição, se há a possibilidade de suspensão condicional do processo, bem como se é competente para julgar tal fato. No caso de ser possível a suspensão do processo, o juiz procederá de acordo com o disposto em lei; e, no caso de incompetência de juízo, esse deverá encaminhar os autos ao juízo competente para julgar a infração, dando assim maior celeridade ao processo.
Em As Alterações introduzidas pela lei n.º 11.719 de 20 de junho de 2008 no processo penal, visa-se apresentar as questões mais importantes sobre o emendatio libelli, mutatio libelli, suspensão e procedimentos processuais.
Dentre as questões mais relevantes a serem abordadas na análise do tema em foco, pode-se enumerar as seguintes indagações:
Quais as principais alterações introduzidas pela lei n.º 11.719 de 20 de junho de 2008, no que diz respeito à sentença e atuação do juiz?
Como era, e agora como ficou a operacionalidade do instituto do emendatio libelli?
Como era, e agora como ficou a operacionalidade do instituto do mutatio libelli?
É possível a atuação do juiz, de ofício, na celeridade processual no que diz respeito à absolvição com o advento da lei n.º 11.719/2008?
Temos, portanto, como objetivo a demonstração da reforma processual penal de 2008, expondo os poderes da figura do juiz, suas limitações após a lei n.º 11.719 de 20 de junho de 2008, sua função nos institutos de emendatio libelli e mutatio libelli, bem como a atuação do Ministério Público também nesses institutos.
Objetiva-se também a exposição da atuação do juiz na aplicação de agravantes, em sentença condenatória, mesmo quando o Ministério Público tenha opinado pela absolvição do réu, levando em consideração os preceitos fundamentais inseridos na Carta Magna, que, de forma garantista, vai de encontro ao Código de 1940, época em que se imperava no país, e na sociedade de modo geral, um modo autoritário de governo e pensamento.
Sendo a escolha do presente tema motivada por sua importância em relação à atuação do juiz e do Ministério Público no processo penal, quando da denúncia e seu recebimento, seu aditamento quando necessário, sua análise, tese defensiva, e finalmente, sua sentença.
Há quem sustente que os artigos que davam a total liberdade ao juiz de dar ao fato definição diversa da contida nos autos, de forma a observar os agravantes do fato, e consequentemente o aumento de pena a ser cumprida pelo réu, como preceituado no antigo artigo 383 feria o princípio da correlação entre imputação e sentença, que é uma das principais garantias do direito de defesa, e tutelado por via constitucional.
Outros sustentam até que esse artigo não deveria sequer ter sido recepcionado pela Carta Magna, uma vez que o Código de Processo Penal é anterior à promulgação da Constituição Federal, afinal, o Código foi elaborado em pleno Estado-Novo.
Ocorre que esse Código tem de aproximadamente 68 (sessenta e oito) anos de existência, e, passado por 3 (três) Constituições, sendo a última, a de 1988, a mais democrática e garantista de todas as outras, e por via de conseqüência com algumas divergências e confrontos com o já idoso Código.

- Principais alterações introduzidas pela lei n.º 11.719 de 20 de junho de 2008, no que diz respeito à sentença e atuação do juiz:
A lei n.º 11.719/2008 introduziu algumas modificações no processo penal em si, principalmente na atuação de ofício do juiz.
A primeira modificação foi em relação ao artigo 383 do Código de Processo Penal, que antes da lei, dava liberdade ao juiz de dar nova definição jurídica ao fato, mesmo que essa nova definição fosse mais grave que a contida na denúncia ou queixa, além de reconhecer agravantes, caso existissem.
Com a lei n.º 11.719/2008, que lhe acrescentou 2 (dois) parágrafos, essa liberdade deixou de ter seu caráter incisivo, e indicou ao julgador que, mesmo dando definição jurídica ao fato diversa da contida na denúncia ou queixa, sem, é claro, modificar a descrição do fato, ele, de ofício, em conseqüência dessa nova definição, deverá proceder o disposto em lei no que tange a suspensão condicional do processo; desde que, caiba ao caso concreto. E ainda, com essa nova definição, se o juízo não for ou deixar de ser competente, este, deverá, também de ofício, encaminhar os autos para o juízo competente.
Outra modificação introduzida pela lei 11.719/2008 foi em relação ao artigo 384 do mesmo diploma legal que retirou o parágrafo único, e acrescentou 5 (cinco) parágrafos. Onde anteriormente se previa que o juiz, ao reconhecer a possibilidade de nova definição jurídica ao fato, baseado em provas existentes nos autos, circunstâncias elementares explícitas ou implícitas na denúncia ou na queixa, deveria baixar o processo, para que a defesa se manifestasse em 8 (oito) dias, e se quisesse, produzisse prova, podendo ser ouvidas até 3 (três) testemunhas. No caso da possibilidade de nova definição jurídica do fato, se essa importasse em aplicação de pena mais grave, o juiz deveria baixar o processo afim de que o Ministério Público pudesse aditar a denúncia ou queixa, nos casos de ação penal pública, e, em seguida, a defesa tinha 3 (três) dias para oferecer prova, arrolando até 3 (três) testemunhas.
Após a referida lei, esse procedimento ganhou maior celeridade, pois, logo após o encerramento da instrução probatória, poderá ocorrer o aditamento da denúncia ou queixa, quando desta houver a instauração de ação pública, que deverá ser feito em 5 (cinco) pelo Ministério Público, que, caso não o faça, os autos serão remetidos ao Procurador-Geral para que o faça, ou designe outro promotor para fazê-lo, e, só então, se estes não entenderem pelo aditamento, ou entenderem pelo arquivamento, aí sim, o juiz será obrigado a atender a opinião do Ministério Público.
Assim, se deverá ser ouvida a defesa no prazo de 5 (cinco) dias, e, se admitido o aditamento, o juiz, a requerimento das partes designará audiência com inquirição de testemunhas, novo interrogatório do acusado, realização de debates e julgamento, podendo ser arroladas em 5 (cinco) dias 3 (três) testemunhas para cada parte, devendo o juiz ficar, na sentença, adstrito aos termos do aditamento, afinal, o processo deve estar já saneado,o que vem a imprimir maior celeridade à aplicação da tutela jurisdicional penal.
Caso não seja recebido o aditamento, o processo prosseguirá seguindo os mandamentos do Código de Processo Penal.

- A operacionalidade do instituto do emendatio libelli:
Antes do advento da lei n.º 11.719/2008, o instituto do emendatio libelli consistia em, o juiz verificando a comprovação dos fatos, e as circunstâncias constantes do processo, podia condenar o acusado, dando ao delito a definição jurídica que entendesse cabível e não a articulada na peça inicial, podendo até, em sentença, condenar o réu por outro crime descrito, ou seja, sem que houvesse a específica imputação.
Atualmente, com a referida lei, esse poder do juiz, deixou de ser absoluto, uma vez que lhe é dada a faculdade atribuir definição jurídica diversa à dos autos, ainda que essa seja mais grave, desde que não modifique a descrição do fato, mas, caso essa nova definição possibilite a suspensão condicional do processo, o juiz deverá proceder de acordo com o disposto em lei, e aplicável ao caso.
Se a nova definição jurídica do fato deixar de ser de competência do juízo que a proferiu, deverá então, encaminhar ao juízo competente, imprimindo assim maior celeridade ao processo.
Na emendatio libelli não ocorre uma verdadeira alteração do libelo, e sim uma corrigenda da peça acusatória.

- A operacionalidade do instituto do mutatio libelli:
O mutatio libelli, é a verdadeira alteração do libelo, que ocorre durante a instrução do processo, onde se colhem provas de que existem elementos essenciais que estão contidos, expressa ou implicitamente na denúncia, de modo que a sentença não pode ser proferida de imediato.
Assim, anteriormente à lei n.º 11.719/2008, o processo era baixado para que a defesa se manifestasse, e se quisesse produzisse prova, podendo ser ouvida até 3 (três) testemunhas, no prazo de 8 (oito) dias, sob pena de nulidade.
Caso o juiz verificasse que deveria aplicar pena mais grave do que a resultante da imputação não contida expressa ou implicitamente na denúncia, deveria baixar o processo para que o Ministério Público aditasse a denúncia, e, posteriormente, manifestação da defesa, no prazo de 3 (três) dias, podendo inclusive arrolar 3 (três) testemunhas e produzir prova.
Já com o advento da já citada lei, logo depois de encerrada a instrução probatória, o Ministério Pública, caso entenda cabível, poderá aditar a denúncia num prazo de 5 (cinco) dias, podendo inclusive fazer oralmente.
Observa-se também que, caso o Ministério Público não entenda pelo aditamento, o juiz remete os autos ao Procurador-Geral para que esse o faça, ou designe novo membro do Ministério Público para fazê-lo, e, só assim, caso esse não entenda pelo aditamento, esse não será feito, ou ainda, se esse entender pelo arquivamento do processo, assim será feito.
Antes de se admitir o aditamento, a defesa deve ser ouvida em 5 (cinco) dias, e, admitido o aditamento, uma audiência será marcada para inquirição de testemunhas, novo interrogatório do acusado, realização de debates e julgamento, desde que requerida por qualquer das partes.
Se a partir do aditamento houver condição de suspensão condicional do processo, o juiz assim o fará, observando o procedimento disposto em lei; bem como, se deixar de ser competente, encaminhará ao juízo competente.
Em havendo o aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento. Caso não seja recebido o aditamento, o processo prosseguirá.

- A atuação do juiz, de ofício, na celeridade processual no que diz respeito à absolvição com o advento da lei n.º 11.719/2008:
No processo penal, o juiz age sempre em prol dos esclarecimentos da verdade real dos fatos, para dirimir qualquer dúvida que possa ainda existir nos autos do processo, formando, portanto, seu convencimento para julgar a causa.
O Código de Processo Penal não adotou o princípio da identidade física do juiz, princípio o qual o magistrado que não presidiu a instrução do processo, não pode prolatar sentença. Só poderia fazê-lo após determinar novamente toda a instrução.
Esses preceitos foram revogados pela lei n.º 11.719/2008, evitando assim que o processo penal se arraste, tomando mais tempo do que deveria.
Parte da doutrina defende, basicamente, a atuação do juiz, de ofício, só deve ser válida quando em benefício do réu, como prescrito na Lei Maior, considerando nula, ou, ao menos passível de anulação os atos que prejudiquem o réu, seja por não observarem o contraditório, seja por não observarem o devido processo legal.
De acordo com o artigo 385 do Código de Processo Penal, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada, nos casos de ação penal pública. Podem ser reconhecidas, inclusive, as circunstâncias não articuladas na denúncia, desde que presentes no fato típico.
Outra atuação de ofício do juiz é no sentido de absolver o réu (também foi modificada pela lei 11.719/2008), desde que mencione a causa na parte dispositiva reconhecendo estar provada a inexistência do fato, não haver prova da existência do fato, não constituir o fato infração penal, estar provado que o réu não concorreu para a infração penal, não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal, existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena, ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência, não existir prova suficiente para a condenação, demonstrando assim, a observância dos preceitos fundamentais contidos na Constituição da República, de forma visivelmente garantista.
Logo, sob esse ponto de vista, do garantismo constitucional, tornou a referida lei tão importante para o ordenamento jurídico penal, já que além de imprimir mais celeridade ao processo, faz os operadores do direito observarem e respeitarem as garantias fundamentais, que são os pilares da Constituição Federal de 1988.
Ainda na sentença absolutória, o juiz deverá mandar, se for o caso, pôr o réu em liberdade, ordenar a cessação das medidas cautelares e provisoriamente aplicadas, aplicar medida de segurança, caso cabível.
Conclui-se que, a alteração do Código de Processo Penal ao ‘tentar’ privilegiar a celeridade deixou de observar alguns preceitos constitucionais, como o do contraditório e ampla defesa, peças essenciais ao garantismo, reinante no ordenamento jurídico, principalmente em sua corte suprema.

Diego Costa
Advogado inscrito na OAB/RJ, pós-graduando em Direito Processual Civil

O Trabalho Como Direito Humano – Ensaios.

O trabalho é título de honra, que toca a dignidade humana, que o salário deve ser justo e suficiente para manter o trabalhador e sua família de forma decorosa (Manuel Alonso Garcia – Derecho del Trabajo, Barcelona, José Maria Bosch Editor. 1960, p. 122).
O trabalho tem sentido reconstrutivo e na visão hebraica, adquire uma valorização como atividade humana.
E finalmente no Renascimento podemos apontar como ápice do trabalho que é visto como verdadeira essência humana. (Felice Battaglia – Filosofia do Trabalho, São Paulo, Ed. Saraiva, p. 30).
Talvez todas essas idéias estejam misturadas no mundo contemporâneo e globalizado, já que o trabalho vem delineado em nossas vidas desde que nascemos. “trabalho de parto – trabalho que damos a nossas mães – e finalmente, o que vamos ser quando crescermos – (qual trabalho realizaremos para nosso sustento).
Então é neste pequeno intróito que podemos nos questionar: o trabalho seria um direito humano?
É claro que neste artigo –ensaio – não pretendemos traçar definições precisas ou responder definitivamente a questão.
Na evolução histórica do próprio sentido do trabalho na sociedade, temos como mais intrigante a sociedade grega.
Os mais bem sucedidos não trabalhavam verdadeiramente, pois o trabalho só cabia aos escravos. Os ricos precisavam estar livres do trabalho para se ocupar apenas intelecto-artístico.
Por sorte, ou azar, o homem e a sociedade evoluíram e nos presentearam com a tão famosa liberdade e igualdade. E fizeram com que, ao longo destes anos o trabalho passasse a fazer a parte da própria dignidade do ser humano.
Já de há muito está estabelecido no artigo 23 da Declaração Universal dos Direitos Humano”.destaca”, bem como no artigo 1º da Constituição da República Federativa do Brasil “destaca III e IV incisos”.
Adam Smith também já dizia que toda fonte de riqueza provém do trabalho.Esses direitos e garantias fundamentais devem ser exigidos e exercidos pelos cidadãos brasileiros, porque é o próprio artigo 1º que enuncia que o Estado precisa promover o trabalho.
Então o poder público, de um modo geral, não pode se omitir de cumprir esse direito subjetivo público, porque inviabiliza a própria dignidade humana.
A propósito, nos define Alexandre de Moraes in Direito Constitucional 14ª Edição, Ed. Atlas, p. 50: “dignidade da pessoa humana...é o mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar de modo que somente excepcionalmente possam ser feitos limitações ao seu exercício...” “...trabalho – é através do trabalho que o homem garantir sua subsistência e o crescimento do país...”
Não seria demais pontuar que nesta concepção de Estado, como na ação política e juridicamente organizada comprometida num território com poder soberano e um povo livre, visando à garantia de vida deste, constatamos que uma das principais funções do Estado e dar ao povo a dignidade humana, que começa com o trabalho.
Não o assistencialismo, que vimos se perpetrar no nosso país; que apenas faz engrossar a massa dos miseráveis.Mas sim ver a nossa Carta Magna ser colocada na prática. O povo não pode ser tratado como coitado. “É preciso ensinar a pescar, e não dar o peixe; sem o devido esforço”.
A nossa Constituição não despreza os pilares dos direitos fundamentais, e baseia a sua ordem econômica na valorização do trabalho.
Modernamente classificamos esses direitos fundamentais em:

1ª geração - direitos e garantias individuais.
2ª geração – direitos sociais, econômicos e culturais
3ª geração – direitos de solidariedade e fraternidade.

Então não seria o direito ao trabalho, um direito a dignidade humana, ou seja, um direito humano?
Desde os primórdios os filósofos e juristas já tinham dificuldade para definir direitos humanos: - direitos e liberdades básicas dos seres humanos.
Por fim, para tentarmos concluir, nos ensina Norberto Bobbio, in Teoria Geral do Direito, p. 9. Editora Martins Fontes:

“os elementos constitutivos do conceito de direito são três: a sociedade como base de fato em que o direito passa a existir, a ordem como o fim a que atende o direito e a organização como meio para realizar a ordem...Isso significa que o direito nasce no momento em que um grupo social passa de uma fase não organizado para uma fase organizada. É o processo de institucionalização. Deste processo nascem as normas de conduta, que tem sua origem na lei Maior do País - a Constituição. As ações afirmativas deste contidas nesta Constituição, não podem apenas ser mecanismos de compensação, mas medidas de integração. Este é o constitucionalismo moderno.”

Todavia, não adianta prever o trabalho como a própria dignidade humana e não garanti-lo efetivamente, tentando justificar o não cumprimento da Constituição, por fatores econômicos mundiais, tecnológicos e até burocráticos.
A criação de postos de trabalho e a sua garantia é um direito inalienável do cidadão, mas não adianta pretender classificá-lo como direito humano, sem ir ao começo de tudo como bem destacado por Norberto Bobbio, a sociedade, a ordem e a organização .
E essa sociedade tem que visar E essa sociedade tem que visar antes de qualquer coisa a , educação, sem a qual o cidadão nunca estará apto nem a concorrer ao seu direito humano ao trabalho. Não se pode imaginar hoje, que o baixo nível de qualificação de nossos cidadãos possa lhes dar igualdade de condições na concorrência dos postos de trabalho que estão cada vez mais escassos.
O cidadão tem o direito ao trabalho digno, com respeito às legislações do trabalho e social, para que não viva à margem da sociedade, lutando, hoje, com um Estado que mais valoriza as corporações do que seus trabalhadores, esquecendo-se, que o trabalhador, antes de tudo, um ser humano é peça fundamental na engrenagem de uma nação desenvolvida.

A competência da Justiça do Trabalho na fase pré-contratual da relação de emprego.

Dispõe o artigo 114 da Constituição da Republica Federativa do Brasil:

Art. 114 - Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: (Alterado pela EC-000.045-2004)
I - as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

“IX - outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei.”

Não há dúvida que para solucionar direitos e obrigações decorrentes das relações de trabalho, em sentido amplo. Numa situação hipotética, que muito tem ocorrido nos dias de hoje, de um concursado que esteja classificado em um concurso público, para emprego público, a ser regido pela CLT, em que o empregador público, pretere os classificados, fazendo contratos temporários com empresas terceirizadas.
Seria a Justiça do Trabalho competente para dirimir conflitos daí decorrentes?
Basta que o litígio derive de uma dessas modalidades de relação jurídica, (ainda que não formalizada), do trabalho, principalmente se o pedido a ser formulado se dirige a potencial empregador.
Já de algum tempo o STF, tem sedimentado entendimento de que a contratação pela Administração Pública, com base em relação jurídica contratual de emprego, isto é, celetista, é suficiente para determinar a competência material da Justiça do Trabalho para julgar pretensões do futuro empregado público, principalmente após o advento da Emenda 45/2004, que alterou o artigo 114 da CRFB.
Nos ensina Liebman que a competência se liga diretamente com a relação jurídica controvertida, se a relação jurídica material a ser discutida é de direito do trabalho, vê-se claro, num primeiro momento a competência da especializada.
Nos ensina Carlos Henrique Bezerra Leite, 4ª Edição, Curso de Direito Processual do Trabalho, p. 191 que “ no que concerne a relação empregatícia existente no âmbito das empresas públicas e sociedade de economia mista, a competência da Justiça do Trabalho está implícita no inciso I,, do artigo 114 da CF.(competência material original). Mesmo porque os servidores também chamados de “empregados públicos”, são aplicáveis todos os direitos materiais dos empregados em geral, tal como se depreende da nossa Carta no artigo 173, parágrafo 1º.”
Esse é o entendimento que vem sendo adotado também pelo TST:
PROCESSO: RR NÚMERO: 625355 ANO: 2000PUBLICAÇÃO: DJ - 01/07/2005
2.1. JUSTIÇA DO TRABALHO. COMPETÊNCIA MATERIALComo corolário do conhecimento recurso, por violação ao artigo 114 da Constituição Federal, dou provimento ao recurso de revista para anular o acórdão recorrido, em face de erro procedimental, e determinar a remessa dos autos ao TRT para prosseguir no julgamento do mérito do recurso ordinário dos Reclamantes, afastada a incompetência material da Justiça do Trabalho.ISTO POSTOACORDAM os Ministros da Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, unanimemente, conhecer do recurso de revista, por violação ao artigo 114 da Constituição Federal; no mérito, dar-lhe provimento para anular o acórdão recorrido, em face de erro procedimental, e determinar a remessa dos autos ao TRT para prosseguir no julgamento do mérito do recurso ordinário dos Reclamantes, afastada a incompetência material da Justiça do Trabalho. Ademais, a doutrina tem reconhecido a competência desta Justiça Especializada para apreciar e julgar os pedidos referentes ao pré-contrato, em especial quando o pedido deduzido diz respeito à não-convocação de aprovados em concurso público realizado por entidade de direito privado, integrante da Administração Pública direta ou indireta. A competência da Justiça do Trabalho, na hipótese, decorre da potencial e futura relação de emprego a se concretizar com a reclamada, consoante expressa o artigo 173, § 1º, II da CF/88. A pretensão obreira está, inexoravelmente, protegida pelo manto constitucional do artigo 114 da Carta Magna, para quem a Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar outras controvérsias decorrentes do contrato de trabalho. Portanto, é pela natureza da relação jurídica substancial que se estabelece a distinção entre as diversas estruturas judiciárias, inexistindo restrições de cunho jurídico no reconhecimento da competência da Justiça Especializada, para julgar ação de índole pré-contratual. A egrégia 5ª Turma, examinando matéria assemelhada, nos autos do RR-702.000/00, da lavra do Juiz Convocado Walmir Oliveira da Costa, tendo como recorrente o Ministério Público da lavra do Juiz Convocado Walmir Oliveira da Costa, tendo como recorrente o Ministério Público do Trabalho, em que se discutia direitos situados em momento pré-contratual, firmou o seguinte entendimento: “Vale registrar, em última análise, que a Justiça do Trabalho também não é avessa ao deslinde daquelas lides em que a causa de pedir e o pedido tenham relação com prejuízos morais e materiais que possam advir das tratativas preliminares ao pacto de emprego, ou seja, na chamada fase pré-contratual, em que as partes reuniam as condições inerentes às figuras de empregado e empregador, mas a contratação não chegou a ser concretizada. Irrecusável, portanto, a competência material da Justiça do Trabalho para julgar a presente Ação Civil Pública. São, ainda, precedentes da Corte: RR-779.846/2001, de minha lavra, DJ de 21/03/03; RR-86054/2003, DJ de 02/04/04, RR-791324/01, DJ de 30/01/04, RR-698549/00, DJ de 20/06/03 e RR-446080/98, DJ de 09/02/01, Relator Min. Antônio Barros Levenhagen, 4ª Turma.Ante o exposto, intacto o artigo 114 da CF/88, não conheço do recurso de revista interposto.”(extraídos do site:www.tst.gov.br)

Que não se olvide que de há muito, o STF”., já havia entendido que: “Quando o Estado pratica atos jurídicos regulados pelo direito civil (comercial ou trabalhista) coloca-se no plano dos particulares” RDA 46/192, RTJ 29/465, 39/462,...”

Voltando a questão hipotética para melhor analisar a competência, não podemos nos olvidar que a administração pública direta ou indireta no exercício da atividade administrativa deve se nortear, pelos princípios da legalidade e moralidade.
É do inciso II do artigo 37 da CRFB:

“II- a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego na forma prevista em lei...”

Logo, ao editar um ato administrativo, in casu, edital a que se submete o concurso público, a administração pública o fez, destinando verbas em grande escala para a sua realização, fazendo–o motivadamente, fundado em sérias razões, e, principalmente na premente necessidade do provimento de cargos a que se destina o certame.
O pressuposto lógico de todo ato administrativo, como sabemos, deve ser também a boa-fé, lealdade e respeito aos administrados. O concurso público, entendido como conjunto de atos administrativos que visa à a aferição das aptidões de candidatos ao fito de selecionar os melhores para o provimento dos cargos públicos.
Pactua-se assim, normas preexistentes entre os dois sujeitos da relação editalícia: Administração e Administrado/candidato. Tal relação tem o poder de vincular ambas as partes
Gozam de presunção de legitimidade, uma vez editados contam com a prerrogativa: serem sempre voltados para o interesse público. Ora, se o candidato/ administrado cumpre com suas obrigações, i.e., estudando e sacrificando-se, gastando seu tempo e dinheiro na esperança de ser aprovado e contratado (como previsto no edital) e ter o verdadeiro retorno de seu investimento, a não contratação deste concursado, preterido por contratos temporários com empresas terceirizadas, implica na quebra do princípio da boa-fé, da lealdade, da moralidade, dentre outros acima mencionados.
Com efeito, segundo José dos Santos Carvalho Filho in Manual de Direito Administrativo. Editora Lumen Iuris, p. 19, 20ª. Edição, que “o princípio da moralidade está associado a “preceitos éticos” a distinguir o que honesto do que não é honesto, e cremos que ninguém de bom senso pode admitir ser ético, honesto, convocar um concurso público e não contratar os aprovados , mesmo existindo vagas para outros” empregados”. Se não pretendia substituir seus “terceirizados” porque realizou o concurso?
Isso seria gestão temerária, movimentar o aparato estatal sem o devido interesse público e deve ser coibido pelo Judiciário, in casu, do Trabalho. Estabelece o artigo 41, da Lei 8666/93 que a “Administração não pode descumprir as normas e condições do edital ao qual se acha estritamente vinculada”. Ora, nessas condições a não nomeação de candidato aprovado em concurso público dentro do quadro de vagas ou para o famoso “cadastro de reservas”, quando existem empregados “terceirizados” ocupando as supostas vagas, faz surgir a lesão, não mais a uma mera expectativa de direito e sim a um direito subjetivo, que deve ensejar a tutela jurisdicional.
Frise-se, por oportuno,que esta moralidade administrativa, comparada a boa-fé objetiva do direito privado, que tende sempre a atender a finalidade, que é requisito mor do ato administrativo.
Portanto se a finalidade (interesse coletivo/público), elemento vinculado do ato administrativo, in casu, preencher vagas e formar o cadastro de reserva para futuras vagas, se existem empregados terceirizados ocupando estas vagas, preterindo a chamada dos candidatos legitimamente aprovados, há no mínimo um abuso de direito por parte do Administrador, que tem que ser coibido pelo Judiciário.
Vale destacar o voto proferido por Hamilton Carvalhido e Helio Quaglia Barbosa em recente julgado do STJ:

“O candidato aprovado em concurso público tem mera expectativa de direito à nomeação, que deve ser praticada por conveniência e oportunidade da administração pública. Mas essa aprovação se torna direito subjetivo se houvesse inequívoca manifestação da necessidade de provimento do cargo durante o prazo de validade do concurso ou ainda que houvesse contratação de pessoal para preenchimento das vagas em flagrante desrespeito aqueles regularmente aprovados, e aptos a ocupar o mesmo cargo.”

“Concurso Público: Direito à Nomeação
Por ofensa ao art. 37, IV, da CF ("durante o prazo improrrogável previsto no edital de convocação, aquele aprovado em concurso público de provas ou de provas e títulos será convocado com prioridade sobre novos concursados para assumir cargo ou emprego, na carreira;"), a Turma deu provimento a recurso extraordinário para assegurar a nomeação de candidatos aprovados em concurso público para o cargo de professor assistente da Universidade de São Paulo - USP. Considerou-se que, no caso concreto, ficara comprovada a necessidade da Administração no preenchimento das vagas, haja vista que a Universidade de São Paulo contratara, no prazo de validade do concurso, dois professores para exercerem o mesmo cargo, sob o regime trabalhista - sendo um deles candidato aprovado do mesmo concurso. Afastou-se, ainda, a fundamentação constante do acórdão recorrido no sentido de que seria necessária a abertura de novo concurso pela Administração para a comprovação da existência das vagas. Precedente citado: RE 192.568-PI (DJU de 13.9.96).”
RE 273.605-SP, rel. Min. Néri da Silveira, 23.4.2002. (RE-273605)
MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. DECADÊNCIA. PRAZO INICIAL. DATA DE EXPIRAÇÃO DO PRAZO DE VALIDADE DO CONCURSO. REVISÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. PRETERIÇÃO DE CANDIDATO APROVADO. 1.Em se tratando de pedido de nomeação em cargo público mediante aprovação em concurso, o prazo decadencial começa a fluir da data de expiração da validade do concurso público. A Constituição Federal, no seu artigo 37, incisos II,IV e IX, a obrigatoriedade da realização de concurso público para o provimento de cargos e funções relativas às atividades típicas de Estado, excetuando as hipóteses de investidura em cargo em comissão e de contratação temporária para atender a excepcional interesse público. O direito à nomeação existe quando a Administração Pública viola, por meio de ato expresso ou de subterfúgio, a ordem de classificação prevista no edital ou desconsidera o prazo de validade do certame ainda pendente. Verbete n. 15 da Súmula do STF. Restando comprovado que contratos emergenciais foram realizados e/ou prorrogados dentro do prazo de validade do concurso, está evidenciada a preterição no direito à nomeação di impetrante, violando o artigo 37, incisos IV e IX, da Constituição Federal.(MS. 70022742316, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS., Relator: Arno Werlang, Julgado em 28/04/08(in.www. vlex.com.br/vid/51392291)”

Com essa explanação, só podemos concluir que os nossos Tribunais, vem defendendo nossos cidadãos aprovados regularmente nos concursos públicos e deixando de dar legitimidade a imoralidade administrativa da enxurrada de editais que visam apenas à arrecadação de verba, sem nenhuma responsabilidade no fiel cumprimento do objetivo da administração.

Petruschka Moura Eça da Costa
Advogada inscrita na OAB/RJ, pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Direito em Artigos

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Aqui você irá encontrar publicações de pareceres, estudos, artigos, e até pensamentos, todos, ou quase todos jurídicos de dois advogados recem formados, com visões muitas vezes críticas sobre nosso ordenamento jurídico.



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